sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Rua da Valla - J.J. Seabra (Baixa dos Sapateiros)



A Baixa dos Sapateiros nunca foi um lugar cheio de pompa, muito pelo contrário. Guarda desde sempre uma atmosfera de comércio popular, daqueles simples, com muito movimento para lá e para cá. 

A rua cantada pelo mineiro Ary Barroso, ganhou essa fama por reunir um bom número de italianos que trabalhavam em suas fábricas de sapatos, árabes que trabalhavam com couro e um monte de sapateiros. Na época, bastava uma chuvinha para alagar tudo que vinha do Rio das Tripas.

Até o início do século XIX boa parte da Baixa dos Sapateiros ainda era um pântano. Era conhecida como a Rua da Valla e a região tinha bastante vegetação e muitas árvores de jacarandá, cuja madeira era usada em construções da Cidade.

Só depois de uma drenagem no final do século XIX, onde o Rio das
Tripas foi tubulado a uma profundidade de 7 metros pelo governador J.J. Seabra ministro da Viação e Obras Públicas, de 1910 a 1912, e governador da Bahia, em dois períodos: 1912 a 1916 e 1920 a 1924, que a enorme avenida trocaria de nome oficial e levaria o nome do seu benfeitor.

Matadouro da Bahia

Pouca gente sabe, mas o primeiro matadouro da Bahia funcionava no terminal de ônibus da Barroquinha. As vísceras dos bois eram jogadas numa vala que nasce no local, chamada na época de Vala de Cidade. Com o tempo, as pessoas começaram a chamar a Vala de Rio das Tripas, explica o historiador Cid Teixeira.

“(...) Das hortas feitas no brejo limite da doação saía o rio que foi durante anos a vala da cidade, defesa natural da parte leste – a mais vulnerável – do sítio primitivo da cidade. Lá, à margem, tão logo houve gado disponível, fizeram-se os abates para consumo dos moradores. Das vísceras lançadas no curso d’água, um topônimo – Rio das Tripas. Para entulhar o alagadiço, fez-se da orla do pântano o depósito de lixo da cidade (...)”.

As primeiras alusões à existência de um matadouro público em Salvador, situam-no no século XVIII, na área contígua ao Mosteiro de São Bento, denominada à época de Hortas de São Bento e situada onde atualmente fica a estação Barroquinha.

Durante todo século XVIII, e até o início do século XIX, foi ali que existiu o Matadouro Público, ainda abastecido do gado que vinha pela Feira do Capoame. Em vários espaços próximos às Hortas de São Bento, existiram currais menores onde o gado esperava o abate, desde o dia anterior, para a madrugada do dia seguinte.

O abatedouro saiu dali e foi para o Barbalho, mas o nome ficou gravado.

A Vala da Cidade nascia na Rua da Barroquinha, atravessava a Praça das Veteranos e passava pela área que hoje é a Baixa dos Sapateiros até chegar aos Dois Leões, onde se encontrava com o Rio Camurugipe. O historiador explica que boa parte do que hoje se conhece por Baixa dos Sapateiros era , na verdade, a Vala da Cidade.

“No início, a Baixa dos Sapateiros era apenas aquele trecho abaixo do Pelourinho, entre o Passo e o Taboão. Entre as décadas de 60 e 70 do século XIX, alguns vereadores contrataram José de Barros Reis para cobrir a vala e transformá-la numa rua”, conta Teixeira. Barros Reis fez uma obra de engenharia e transformou a Vala da Cidade na Rua da Vala, que por extensão também passou a ser chamada de Baixa dos Sapateiros. “Esta foi a primeira Rua de Vale que a Bahia teve”, diz o historiador, confirmando a importância do Rio.

Referências
https://365salvador.wordpress.com/2013/11/26/26-de-novembro-baixa-dos-sapateiros/
http://salvadorhistoriacidadebaixa.blogspot.com.br/2011/02/baixa-dos-sapateiros.html
http://www.salvador-antiga.com/baixa-sapateiros/antigas.htm
http://panoramametropole.blogspot.com.br/2013/03/rio-das-tripas.html
http://carlosnovaesribeiro.blogspot.com.br/2009/09/rios-da-cidade-sao-pouco-conhecidos_24.html
http://riolimpo.blogspot.com.br/2011_10_01_archive.html

Pegando um baba 3/3 - Campo de Rio Vermelho



Em 29 de maio de 1906, o Campo da Pólvora assistiu o último jogo do campeonato e já no ano seguinte a Liga transferia o certame para o Ground do Rio Vermelho, na Fonte do Boi, inaugurado em 2 de junho de 1907, com entradas pagas. Foi um Deus nos acuda para a população aceitar as novas regras: pagar para ver o jogo da bola. E muito trabalho para se deslocar de bonde, já que o lugar era bem distante do centro.

Hipódromo do Rio Vermelho
No Rio Vermelho o futebol foi praticado nos mesmos espaços onde havia se dado o turfe, ou seja, ainda não possuía um espaço especifico se valendo da adaptação de outros para acontecer, o que denota sua característica de esporte ainda em fase de organização na cidade de Salvador, mas mesmo assim, experimentou tempos gloriosos.

“o campo oficial de futebol era aqui no Rio Vermelho, a Liga Bahiana de Desportos Terrestres, e os campeonatos eram disputados aqui. Nessa época, no dia do jogo, o bairro se enchia de gente, os torcedores. Os clubes campeões daquele tempo eram o Ipiranga e o Botafogo…”.

Depoimento da Prof. Stella Calmo Teixeira no livro Rio Vermelho: projeto histórico dos bairros de Salvador. Salvador: FUNCEB, 1988.

O campo do Rio Vermelho passou a ser o campo oficial e um dos cinco autorizados pela prefeitura para a prática do esporte. Os outros eram o da Pólvora, já referido, e os da Quinta da Barra, Largo do Barbalho e Largo do Papagaio. O campo do Rio Vermelho padecia dos mesmos problemas que o da Praça dos Mártires: as pessoas atravessavam o espaço em pleno jogo; sempre tinha alguem mais agitado que dava uns empurrões no juiz e não tinha onde sentar; quem queria conforto tinha de trazer a cadeira de casa, numa carroça de burro; enfrentavam a inclemência do sol com os chapéus, de hábito na indumentária dos baianos daquele tempo, e sombrinhas improvissadas em especial para as mulheres.


Desta forma e sob esta condição, o futebol segue sendo no Rio Vermelho até que veio

“uma crise inevitável do foot-ball, crise esta que só pôde ser atribuída aos meios deficientes de condução para o Rio Vermelho, que motivaram aos poucos, o empalidecimento da estrela do foot-ball (GAMA, 1923, p. 320)”. 

Reforçando o que pareceu ser o pior problema do futebol no Rio Vermelho, Leal (2002) demonstra que 

“a cidade se espalhava, havia necessidade de se construir um campo de foot-ball mais próximo do centro para satisfazer a todos os soteropolitanos, já que o esporte bretão tinha crescido acentuadamente e os bondes chegavam ao Rio Vermelho lotados (p. 185).” 

Mesmo com a mudança do futebol para outro espaço, o Rio Vermelho continuou a ser importante para este esporte, pois, vários clubes passaram ou tiveram sede no bairro e destes, destacamos o Botafogo (1914) e o Ipiranga (1906) que usavam campos no Rio Vermelho.

Muitos anos depois, em 1919, os baianos teriam de fato um campo de qualidade. o “Stadium” da Graça, construido em terreno e por iniciativa do ex-jogador do Esporte Clube Vitória Arthur Moraes, mas isso já foi contado em outra postagem.

Referências:
https://historiadoesporte.wordpress.com/2009/11/23/rio-vermelho-um-arrabalde-esportivo-nas-terras-de-salvador/
http://www.ibahia.com/a/blogs/memoriasdabahia/2012/08/27/os-primeiros-campos-de-futebol-de-salvador/
Revista Artes e Artistas: sports, theatro, humorismo e cinema, Ano IV, n. 150, Seção Sportivas, p. 150

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Pegando um baba 2/3 - Campo da Pólvora (Campo dos Mártires)


 ”Para ir ao Campo da Pólvora o caminho era um só e o veículo unicamente um. Todos iam a pé, desde São Pedro. Iam e voltavam e lá , senão tivessem amigos nas vizinhanças que lhes emprestassem cadeiras, teriam que ficar a tarde toda em pé”.
Aloísio de Carvalho Filho, revista Semana Sportive 1922


Tudo começou em 21 de outubro de 1901 quando José Ferreira Junior, o Zuza Ferreira, improvisou um campo de futebol no Campo da Pólvora, que até então era denominado de Campo dos Mártires. Zuza marcou o espaço do gol com duas pedras grandes, dez metros entre uma e outra, sendo também disputado o primeiro jogo. Em 30 de outubro de 1903 foi disputada a primeira partida internacional, por marinheiros americanos que se encontravam em Salvador e um combinado anglo-brasileiro.

Em 9 de abril de 1905, o Campo se tornou oficial com os jogos realizados da Liga Baiana de Esportes Terrestres (atual Campeonato Baiano). A estreia foi com um jogo realizado entre Internacional e Vitória, com uma vitória de 3 a 1 do Internacional. O Campo da Pólvora não tinha arquibancada. O público se posicionava pelos quatro cantos do campo que era "cercado" por cadeiras onde se sentavam as senhoras, além disso o público tinham que se vestir a rigor, pois o futebol naquela época era feito para a elite.


O Campo da Pólvora era arena mesmo. A poeira incomodava e respeitáveis médicos alertavam nos jornais quanto ao perigo dos jogadores e a torcida formada por parentes e amigos contrairem doenças pulmonares.

O Dr. Reis questionava os jogos realizados no Campo da Pólvora, com excesso de poeira para os jogadores e mesmo para o público, já que era um terreno de chão batido. Nessas condições, dizia o ilustre esculápio, a cultura física ”não podia chamar-se cultura da saúde do corpo, mas sim de ruína do corpo”.

Referência:
http://www.ibahia.com




quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Pegando um baba 1/3 - Stadium Artur Morais ( Campo da Graça)




"O lindo pavilhão da arquibancada, como um enorme jardim aéreo, mostrava no encanto de suas flores, a graça e a formosura, tocadas pelo entusiasmo da torcida, ativando com seus perfumes a alma… Senti-me vacilar, na incerteza de que estava num campo de esporte ou em um salão de baile”.
Revista Semana Esportiva 1920

O Campo da Graça tornou-se palco dos grandes acontecimentos da cidade como os exercícios de ginástica sueca praticados pelo corpo da Brigada Militar durantes as comemorações do Centenário da Independência; apresentações de bandas e fanfarras, espetáculos circenses e outras manifestações. O público frequentava o espaço, trajado a rigor, exibindo elegância, as mulheres com seus melhores figurinos e jóias.

Era o ano de 1919 e o estádio seria inaugurado em novembro do ano seguinte, construido em frente ao Café Rio Branco, entre as ruas Catharina Paraguassu e Humberto de Campos com acesso pela Avenida Euclides da Cunha. Localização estratégica, próxima da sede dos clubes da elite baiana: Bahiano de Tênis e Associação Atlética da Bahia que tinham constituído uma entidade aparte e estavam afastados do campeonato oficial. As elites aceitavam a popularização do esporte, mas a contrapartida era um campo com melhor infraestrutura.

Idealizadores

Inicialmente, os jogos de futebol eram realizados no Rio Vermelho onde existia também um hipódromo. O local era particular e a então Liga pagava uma determinada importância para a realização de seus jogos. Também se faziam jogos no Campo da Pólvora.

Nesse ínterim, um grupo de abnegados, tendo a frente o eng. Arthur Morais, ex-zagueiro do Esporte Clube Vitória e então dirigente esportivo, comprou um terreno na Graça com o objetivo de construir um estádio. Esse terreno pertencia à família Rêgo. Em 15 de novembro de 1920 o Estádio da Graça era inaugurado com a presença do então governador José Joaquim Seabra. Quando Arthur Morais faleceu, em sua homenagem, o estádio passou a chamar-se Estádio Arthur Morais.Praticamente, todos os assentos eram de madeira na parte da geral, como as arquibancadas de um circo. Na parte mais nobre, fizeram uma arquibancada em dois andares, ainda em madeira e com cobertura de folhas de zinco. Algo bem mais sofisticado! Apesar do material, ao que se sabe, nunca ocorreu nenhum desabamento no velho Campo da Graça. A madeira deveria ser de lei!

Anos de ouro

Durante três décadas o Estádio da Graça, antes denominado de “Stadium” e “Campo” foi o cenário de grandes jogos organizados pela Liga Baiana de Futebol e Federação Baiana de Futebol, inclusive “matchs” com times de outros estados e outros países e a presença ilustre de visitantes, autoridades do Brasil e do mundo.

Cenário também do primeiro BaVi, do primeiro título conquistado pelo Esporte Clube Bahia em 1931 e de muitos outros conquistados pelo Esporte Clube Vitória, Galicia, Ipiranga, Botafogo, dentre outros.

Nele também se exibiu a Seleção Brasileira em 1934 contra o Bahia, derrotando-o por 8x1, gols de Leônidas(4), Átila(2) e Carvalho Leite(2) para a seleção brasileira. Não se sabe quem fez o gol do Bahia.

A Bahia ficou de fora do mundial por falta de estádio pronto

No tempo em que a única forma de chegar à Graça era de bonde, havia a esperança de que Salvador fosse uma das cidades-sede daquele Mundial. Acanhado, o Stadium Artur Morais, nome oficial do campinho, carecia de reforma. “Deste amontoado de zincos e arquibancadas desengonçadas surgirá um estádio à altura do progresso da nossa capital(...) A nossa futura praça de esportes poderá servir de teatro para a disputa do Campeonato do Mundo”, confiava a revista.

A reforma foi projetada, plantas da nova estrutura publicadas em jornais da época. A Revista Rádio Esportes estampava o governador Octávio Mangabeira no lançamento da pedra fundamental, em pleno 2 de julho. Não saiu do papel. Segundo o pesquisador Mário José Gomes, 74 anos, foram dois os principais motivos que impediram o projeto de ir adiante. Primeiro: em uma primeira vistoria, o Campo da Graça não passou pelo crivo da Fifa. “Sequer as dimensões do campo eram oficiais. O Campo da Graça tinha menos que os 90 metros mínimos de comprimento. E naquela época já existia o padrão Fifa”, afirma Gomes. A outra questão era o lugar nobre em que ele ficava. “Os moradores da Graça, bairro de elite, protestaram. Eles não queriam a ampliação”.

Só havia outra possibilidade. Em 1939, o estado havia desapropriado uma área na Fonte Nova. Na verdade, antes mesmo da ideia da reforma da Graça, desde o início dos anos 40, já existia um projeto ousado para aquela região: a construção de uma grandiosa praça esportiva. Segundo o engenheiro Paulo Segundo da Costa, autor de biografia sobre Octávio Mangabeira, o então interventor Landulfo Alves chegou a determinar que a Secretaria de Viação e Obras Públicas fizesse o projeto.


A tarefa coube ao escritório do engenheiro Mario Leal Ferreira, que incumbiu o arquiteto Diógenes Rebouças de elaborar o plano. Com a destituição de Landulfo Alves pelo presidente Getúlio Vargas, o projeto original jamais sairia do papel. “Faltaram recursos e o novo interventor não levou a coisa pra frente”, conta Paulo Segundo, na época estudante de Engenharia. Com a eleição de Mangabeira, em 1946, voltou-se a cogitar a construção.

Apito final


Em 1951 o Estádio da Graça perdeu a sua finalidade, substituido pelo recêm construido Estádio da Fonte Nova, mais confortável e com maior capacidade de público. Prevalecia as ideias de um novo tempo em que o futebol já era concebido como um esporte de massa, paixão de multidões.

O Campo da Graça resistiu bravamente às investidas das construtoras até 1970 quando então seu espaço foi vendido e no local se construíram quatro grandes prédios.

Referências
http://www.ibahia.com/a/blogs/memoriasdabahia/2012/11/12/o-estadio-da-graca-campo-de-grandes-torneios-e-palco-dos-grandes-acontecimentos-da-cidade/
http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/em-1950-a-bahia-ficou-de-fora-do-mundial-por-falta-de-estadio-pronto/?cHash=e7e276274af6e7a1d6f00852e579194c
http://salvadorhistoriacidadebaixa.blogspot.com.br/2011/04/destaques-da-graca-campo-de-futebol-da.html